dezembro 17, 2011

Natal: a surpresa de um poema com outra liturgia.

Votos de bom Natal.

O  anjinho de cartão que me "visita" todos os Natais
Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.
.
Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
.
Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.
.
Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.
.
Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.

Manuel Alegre

1 comentário:

  1. M.C., gratíssima pelo poema de Manuel Alegre, que desconhecia, e pelos votos, que retribuo.

    Dois beijos,

    eli


    No sapatinho, deixo de Jorge de Sena - talvez o poema que, nesta época, mais me signifique - Natal 1971



    Natal de quê? De quem?
    Daqueles que o não têm?
    Dos que não são cristãos?
    O de quem traz às costas
    as cinzas de milhões?
    Natal de paz agora
    nesta terra de sangue?
    Natal de liberdade
    num mundo de oprimidos?
    Natal de uma justiça
    roubada sempre a todos?
    Natal de ser-se igual
    em ser-se concebido,
    em de um ventre nascer-se,
    em por amor sofrer-se,
    em de morte morrer-se,
    e de ser-se esquecido? Natal de caridade,
    quando a fome ainda mata?
    Natal de qual esperança
    num mundo todo de bombas?
    Natal de honesta fé,
    com gente que é traição,
    vil ódio, mesquinhez,
    e até Natal de amor?
    Natal de quê? De quem?
    Daqueles que o não têm,
    ou dos que olhando ao longe
    sonham de humana vida
    um mundo que não há?
    Ou dos que torturam
    e torturados são
    na crença de que os homens
    devem estender-se a mão?

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